Posfácio
O ousado que deu certo e gerou vida
A poesia é
feita daqueles momentos, sons, rimas, cheiros, cores e gostos que marcaram a
gente de alguma forma – e aí a forma pouco importa, mas foram capazes de
despertar algum sentimento ou mesmo uma ideia. O artista, o poeta, o encantador
de palavras sente-se compelido a reunir os fragmentos em uma sequência nem
sempre lógica, nem sempre linear, nem sempre uníssona, para eternizar aquilo
que nos perturbou a alma quer seja por alguns instantes.
Fato é que nem
sempre escrever poesia é tocar a alma do espectador. Depois de ultrapassado o
limiar que separa o mundo externo do interior (afinal, “a palavra mora fora do
mundo”) e de ter passado pela morada da razão, a poesia ainda encontra a barreira
do lar onde moram as emoções. Lá, nem todos entram, nem todos ficam. Mas há
pessoas capazes de bater à porta desta morada, cujo dono pode até, no momento,
ousar não abrir, mas se concede uma fresta, renderá, por fim, à abertura
completa.
É isso que nos
provoca a ler. E foi assim comigo, quando tive à altura dos olhos a obra Efígies, que chegou até a mim por
intermédio de um amigo em comum, o literário Luiz Antônio Cardoso, que me
desafiou a lê-la. O desafio, admito, foi mais prazeroso do que poderia supor.
Com “tato profissional”, mas, sobretudo, com ousadia poética, passeando pelos
temas da criação ao que provoca asco; abusando das formas – que importam? -,
Wildman surpreende ao expor a palavra sem máscaras, sem pretexto, mas com
significados. Basta ler – e tenha certeza de que você perderá bons e longos
momentos nesta leitura – para se ver tentando decifrar cada poema.
Caminhei pelo
livro como quem procura descobrir o que há por trás da máscara. Deslizei pela
poesia visual como quem acompanha uma cena se desenrolar no palco (observando,
buscando compreender e, por fim, deliciando-se). Cheguei ao final da leitura
como quem volta ao início: preciso reler.
Muitas vezes
me pego corrigindo palavras repetidas, frases sem rima, orações sem pontuação.
Não raras vezes quero excluir os espaços em branco, preencher as linhas,
aproveitar cada canto. Mas Wildman mostra que nem sempre é preciso fazer isso.
As palavras quando bem repetidas têm seu propósito, cumprem sua função, compõem
a melodia, assim como a ausência da rima provoca a mente a aceitar a forma.
Efígies – Poesia é uma entrega ao leitor
que não quer mais saber do lugar-comum, que não quer apenas a rima pela rima e
sua graça, que não quer mais o prato pronto sobre a mesa. Efígies – Poesia é um atentado necessário, na minha opinião, à
mente que busca pelo que é criativo, experimental, inusitado, sem contudo
deixar de ser poesia. É o que percebo que faz, e fez por vários anos, Wildman,
que, nesta coletânea, entrega ao leitor seus rabiscos preciosos, ora em formato
de texto, ora em textos escritos em outra língua, outras vezes em poesia
concreta. Só alguém viajado, que saiu do Vale do Paraíba, para respirar outras
paisagens, e se expressa em outro idioma, poderia fazer tal entrega. A literatura, as artes, a vida precisa desta
ousadia, quebrar com o preconceito de não poder ser livre a sua maneira.
É, sem dúvida,
leitura a ser feita pela primeira vez e revisitada tantas quantas forem
possíveis, pois em cada uma destas visitas a máscara revela um novo conceito e
os “átomos de suas palavras me chegam”. “Cessam-se as falas”, revelam-se os
enigmas, caem-se as máscaras. A alma, por fim, é tocada. É muito bom saber que
um arquiteto de palavras do gabarito de Wildman ousa tornar mais uma vez
público seus textos escritos em algum lugar, por aí, desta e daquela forma.
Letícia
Martins
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Autora: Letícia Martins é jornalista formada pela Universidade de
Taubaté (Unitau), pós-graduada em Gestão de Pessoas, autora do site
www.primeirasimpressoes.net. Nascida em Taubaté, mora atualmente na capital
paulista, onde escreve para revistas e atua como assessora de comunicação e
revisora de livros. E-mail: leticia@primeirasimpressoes.net